Independência financeira

Da faculdade ao primeiro apê: sonho e ansiedade

Em busca da independência financeira, os jovens podem sentir a pressão da maioridade

Laura Madalossi e Mariana Felipe
27 de novembro de 2024
Foto tirada por Ana, segurando a chave de seu apartamento

Todo jovem sonha em ser independente financeiramente. Quando se completa a maioridade, vem a pressão por entrar na faculdade, ter um bom emprego, comprar um carro e sair da casa dos pais. No meio social a pressão é pelo status, postar experiências nos stories e ser visto como alguém interessante. Todas essas atividades demandam dinheiro e, quando as expectativas não são alcançadas, podem levar à frustração e sentimento de incapacidade. Segundo a pesquisa realizada pela Fundação Varkey, em parceria com a Populus em 2017, 58% dos jovens brasileiros elegeram “dinheiro” como sua maior fonte de ansiedade.

A busca por ter o próprio dinheiro e independência pode ser despertada desde cedo por diversos fatores, como problemas familiares, busca por sucesso ou desejo de autonomia. Ana Beatriz Machado Fabbri, aos 10 anos, viu seus pais se separarem e teve sua guarda compartilhada. Morando em duas casas, ela sentia que não tinha um lugar próprio, o que despertou o desejo por arranjar seu cantinho assim que completasse 18 anos.

Conseguir a própria casa antes dos 20 parece um sonho distante, mas segundo Mauro Borges, gerente comercial de uma agência do Banco Bradesco, existem  financiamentos como “Minha Casa, Minha Vida”, inclusive com subsídios oferecidos por órgãos governamentais, que auxiliam nesta jornada.

“É importante dar um salto como esse somente quando estiver estabilizado num emprego ou trabalho que lhe garanta suprir suas despesas fixas, sem comprometer mais que 60% da sua renda para o pagamento de seus compromissos financeiros”, explica Borges. O gerente também ressalta que morar sozinho implica em outras despesas, como água, luz e transporte. Para ele, o ideal é que o valor da parcela não ultrapasse 30% da renda.

Para viabilizar o pagamento de todas essas contas e arcar com as despesas de morar sozinha, nossa personagem Ana Beatriz foi à luta. Aos 18 anos, Bia conseguiu um emprego estável como recepcionista, uma bolsa de estudos na universidade e com o auxílio do programa “Minha Casa, Minha Vida” conseguiu financiar um apartamento com seu próprio dinheiro. Como não se planejou adequadamente, a maior parte de seu salário ia para despesas fixas da casa, deixando-a com poucos recursos para outras necessidades e lazer.

“Bateu certinho [as contas]. Na época eu recebia R$1.800 e os meus gastos davam R$1.790, então eu falei: ah, eu consigo. Porém, a gente não gasta só isso, né? Os gastos sempre passam um pouco mais. Às vezes dá uma m… e estoura um cano.”

O que a ajudou a se organizar nos primeiros anos em meio aos boletos foi anotar toda a sua renda e despesas em um papel. Esse é um conselho que a professora de economia, Leny Paschoal, também recomenda aos jovens: criar uma planilha financeira para ter uma visão clara da renda e das despesas. Hoje já existem vários aplicativos que fazem todos os cálculos, facilitando a rotina. “Isso para quem mora sozinho é como tirar um peso da cabeça. Ao invés de ficar pensando, o aplicativo pensa por você”, diz Bia.

Aos 18 anos, com o auxílio do programa “Minha Casa, Minha Vida”, Bia conseguiu financiar um apartamento com seu próprio dinheiro

Como a estudante estava fazendo faculdade, a sua mudança de um emprego fixo para estágio foi desafiadora, já que o estagiário não tem os mesmos direitos que o trabalhador registrado e o salário é menor. Ela começou a atuar como freelancer e, buscou um segundo estágio para manter suas despesas. Por isso, vale ressaltar que o planejamento financeiro é importante. “Primeiro você guarda. Depois você gasta”, diz a professora Leny.

Vale lembrar que apesar de buscar independência, Beatriz nunca foi desamparada pelos pais, pois eles sempre ajudaram quando necessário. Mesmo assim, pela falta de educação financeira, houve um momento em que a mesma ficou com o “nome sujo”. Segundo o gerente, a pressa por ter um estilo de vida acima de suas possibilidades financeiras, é o maior fator que leva os jovens ao endividamento.

De acordo com Leny, seria primordial haver educação financeira nas escolas, pois assim os jovens aprenderiam a ter controle do que ganham e gastam. “No Brasil, há muitos jovens com o nome sujo por não terem aprendido educação financeira.”

Problema maior acontece quando se tem cartão de crédito, um recurso para ser utilizado adequadamente e afetar apenas uma parte da renda mensal. “Eu tive que gastar mil reais de revisão e pneu com a minha moto. Se eu não tivesse cartão, não ia conseguir pagar”, conta Beatriz, já fazendo uma autocrítica. “O cartão de crédito é um problema na minha vida. Desde que comecei a usar não consigo me desvincular”, completa.

Esse problema pode se transformar numa despesa impagável. Com juros calculados com base na Taxa Selic, convém que o usuário pague a conta do cartão até a data do vencimento para não serem cobrados juros.

De maneira geral, os jovens não se interessam por economia, diz a Leny Paschoal. “Como docente universitária, vejo que poucos alunos se interessam pelo próprio dinheiro e seu futuro financeiro”. Bia é um exemplo claro disso. “Eu era essa pessoa que deixava o dinheiro ali parado. Depois você vai aprendendo que se coloca em um banco ele pode render. Em outro lugar ele pode dar um valor maior.”

Após muitas experiências e lições aprendidas, Bia entendeu que guardar dinheiro é a melhor forma de se precaver para o futuro e evitar imprevistos. “Se eu quiser ter um apartamento melhor, se eu quiser comprar um carro, eu preciso guardar [dinheiro]. Então comecei a fazer isso a partir desse ano.” Hoje em dia, a jovem segue firme pagando as parcelas do seu apartamento, limpou seu nome e está no último semestre da faculdade.