A primeira forma de amor é a auto aceitação

É possível encontrar paz após a vida virar de ponta cabeça
por Hugo Degaspari Reis

O relacionamento homoafetivo é acompanhado de batalhas internas e quando a redescoberta sexual acontece tardiamente o embate é ainda maior. Ter uma vida hétero que incluiu relacionamentos, muitas vezes, casamento com filhos, e se descobrir homossexual poder estar diretamente ligado à repressão, à não aceitação ou à não-compreensão da atual realidade individual.

De acordo com a psicóloga Mariana Marques, especialista em psicologia clínica, a compreensão tardia da própria sexualidade se dá pela falta de conhecimento e aceitação. “A sexualidade ou a escolha do parceiro amoroso está ligado à condição de mente atual do indivíduo. Torna-se impossível encontrar um único motivo que descreva a demora nessa autocompreensão.”

Mariana: “compreensão tardia da sexualidade é falta de autoconhecimento”

Maria (nome fictício), 27 anos, que não quer ser identificada, diz que demorou aproximadamente sete anos para assumir sua orientação sexual. Dos 16 anos até 23 anos, quando teve seu primeiro relacionamento homoafetivo, sofreu bastante para aprender a se aceitar. “Quando eu me percebi e comecei a sentir atração por meninas, eu fiz de tudo para retrair esse sentimento. Eu queria guardar para mim e, na minha cabeça, achava que não podia ser aquilo.”

A jovem teve relacionamentos heterossexuais antes de se compreender e assumir.  Padrões impostos pela sociedade reprimem o sentimento e a afeição ao próximo quando este é do mesmo sexo. O bloqueio é grande e são várias barreiras e paradigmas a serem quebrados. Socialmente, a heterossexualidade é compulsória, pois há o pressuposto de que todos os indivíduos se atrairão e se relacionarão com o sexo oposto.

A atual companheira de Maria também se reconheceu tardiamente e tem um filho de sete anos do primeiro relacionamento. A criança vive com elas, é criada com muito amor e diálogo o que possibilita que seja saudável e feliz.

ESTEREÓTIPOS – A televisão sempre retratou o homossexual, até então, como um ser caricato e essa representatividade mudou há muito pouco tempo. Era sempre um personagem engraçado, afeminado ou masculinizado. “Eu não me encaixava no estereótipo que me foi apresentado. E isso afetou muito no tempo que eu demorei pra me aceitar”, diz Maria.

Geralmente, o descobrimento da identidade sexual se dá na adolescência, pois é quando o indivíduo, mesmo não sabendo em que aspecto, começa a se compreender e se sentir diferente. Quando esse processo ocorre na fase adulta, isso significa que a pessoa, de alguma forma, teve um novo contato com suas percepções mais íntimas e despertou para essa nova identidade.

A psicóloga Mariana Marques explica que o primeiro passo é se respeitar. “Deve-se ter contato com suas próprias percepções e seus sentimentos. Isso faz com que a mente e o estado emocional da pessoa entrem em ordem e se tranquilizem, mesmo que aos poucos”.

Assumir-se é um processo demorado e, muitas vezes, doloroso. Abrir-se para a sociedade e estar disposto a enfrentar qualquer tipo de situação e reação, seja ela preconceituosa ou até mesmo a negação nua e crua, é bem mais difícil. A reação das pessoas para quem o homossexual conta sua nova realidade auxilia ou dificulta muito. No caso de Maria, o sentimento foi de alívio. “É um peso tão grande que foi tirado das minhas costas!”, diz. Na contrapartida, a recepção negativa pode ser um banho de água fria na coragem de revelar-se publicamente.

Seja qual for a situação, o avanço das legislações, a padronização de comportamentos antes discriminados e sua inserção na mídia, nas manifestações artísticas e culturais, o debate livre sobre o tema, com a ampla divulgação de informações, estimula que os indivíduos assumam sua orientação sexual com mais naturalidade e menos preconceito.

Em países desenvolvidos, esse cenário de respeito aos direitos da comunidade LGBT+ ocorre há muitos anos. No Brasil, ainda é recente. O casamento gay, por exemplo, foi oficialmente regulamentado somente em 2013. Mas, já deu muito resultado. Segundo o IBGE, em 2017, foram registrados aproximadamente 5.900 casamentos homoafetivos.

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