Segundo levantamento realizado pela Prefeitura de Ribeirão Preto, divulgado pelo Serviço Especializado de Abordagem Social (SEAS), o número de pessoas em situação de rua aumentou cerca de 12% em 2022. De 3.540, em 2021, o número saltou para 3.988 pessoas no ano seguinte.
Oficialmente, segundo a Secretaria Municipal de Assistência Social, Ribeirão Preto tem o total de 1.441 pessoas em situação de rua, com base em dados de cadastramento no sistema de abordagens e dentro de um período de cinco meses, considerado o tempo que um indivíduo permanece na cidade. Mas, as incoerências e escassez de informações mais precisas e estudadas demonstram o apagamento dessas pessoas por parte das autoridades e da sociedade civil. A falta de dados concretos é um dado por si só.
Isaías Cruz, vice-presidente do Instituto Limite, explica que, enquanto a exatidão não é alcançada, a população, muitas vezes, enxerga esse grupo em uma quantidade muito maior do que a real. Neste caso, não por empatia, mas por incômodo e elitismo. “É muito comum que alguém olhe para um grupo de 30 pessoas em situação de rua e enxergue 200, pelo incômodo causado pelo preconceito e não pela preocupação, de fato”, diz.
O Instituto Limite faz abordagens sociais, realizando, em média, 400 atendimentos por mês. Na cidade, os arredores da rodoviária central concentram a maior quantidade de moradores de rua de toda a região metropolitana. Segundo Isaías, a inércia do Estado e a falta de políticas públicas eficazes impedem o atendimento de toda a demanda existente.
Direito à moradia, trabalho, saúde e educação, são exemplos citados de políticas que ainda não conseguem, de fato, atingir toda a população. O vice-presidente acredita que essa falha do Estado agrava o crescimento do número de pessoas em situação de rua, apesar de pontuar a existência de outros fatores, muitas vezes pessoais, de cada indivíduo, que também estão relacionados.
QUEM SÃO ESSAS PESSOAS
Em relação à composição desse grupo, Isaías afirma que o gênero masculino predomina ao compor, aproximadamente, 70% dessa população desabrigada, enquanto os outros 30% são mulheres. Ele relata que a abordagem feminina é mais trabalhosa, pois o auxílio não é aceito com facilidade. Porém, essa dificuldade também ocorre entre os homens, em que são feitas várias tentativas, levando em conta o fato de que cada caso é um caso, dependendo muito do tempo de cada indivíduo.
Para entender mais sobre a dinâmica dessa população, dados da capital de São Paulo mostram que migrantes e pessoas negras compõem a maioria dentre aqueles sem os seus direitos básicos. O Censo da População de Rua divulgado pela Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social da cidade aponta que, em 2019, os migrantes correspondiam a 71% do total de 24.344 pessoas que vivem em situação de rua. Pessoas negras, por sua vez, somam o total de 12.435 pessoas em situação de rua, cerca de 51% da população vulnerável de SP, segundo a mesma pesquisa.
Sobre as razões de estarem nas ruas, sem família, em situação extrema de vulnerabilidade, a dependência química, como as drogas, são o principal motivo que leva uma pessoa a essa condição, mas nem sempre é o único. Falta de oportunidades, falta de renda e falta de acolhimento por parte de familiares também podem levar uma pessoa às ruas.
Quando questionado sobre o número de imigrantes em situação de rua, Isaías afirma que apesar de a população acreditar que o número seja alto, a porcentagem não chega a 5%. Ainda assim, a visão higienista de grande parte da sociedade gera estigmas difíceis de superar, segundo a secretária de Assistência Social, Gláucia Berenice. “A população civil deve colaborar para com a intersetorialidade ao respeitar a possibilidade de ressocialização destas pessoas em vulnerabilidade social”, explica.
SEMAS – SECRETARIA MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
A secretária conta que muitas famílias perderam suas rendas após a pandemia, o que contribuiu para que ficassem às margens da sociedade, dependendo de doações. Nesse contexto, “a pessoa em situação de rua é um público heterogêneo e de complexidade que inclui os mais variados motivos para escolher a rua como espaço de sobrevivência, abdicando, muitas vezes, de um projeto de vida”, afirma a Gláucia Berenice.
Segundo ela, a SEMAS possui uma ampla rede de serviços que fornecem o suporte necessário às pessoas em situação de rua. O Centro POP, que é uma unidade pública de atendimento à essas pessoas, o Programa Recomeço, que faz o acolhimento em comunidade terapêutica para pessoas com dependência química, encaminhamento para cursos no Centro de Qualificação e o Centro de Atenção Psicossocial, conhecido como CAPS, são alguns exemplos de programas fornecidos. Por conta da falta de proteção contra o tempo, há ainda protocolos de Enfrentamento de Frentes Frias e Prevenção e Atenção a Pacientes com Tuberculose.
A SITUAÇÃO NA PRÁTICA
Entender o problema social que envolve as pessoas em situação de rua é um desafio complexo. Os números são muito incertos e variáveis, pois a população é flutuante e não fica sempre em um mesmo lugar.
Alguns institutos e associações realizam ações voluntárias que entregam comida e cobertores para áreas mais vulneráveis. O Instituto Simplesmente Amor, uma organização não governamental que sobrevive com bazares e doações, é uma dessas entidades que atuam diretamente nas ruas, com essa população vulnerável.
Longe dos dados e estatísticas, a realidade das ruas é ainda mais profunda do que a contabilizada pelas autoridades. Uma mulher desabrigada, ao ser orientada sobre os cuidados que deveria ter com o cobertor, fornecido por um voluntário do Simplesmente Amor, reagiu dizendo que os cobertores são queimados pela própria polícia. Em seguida, a mulher confirmou essa explicação quando abordada pela reportagem. Outros moradores entrevistados reclamam que seus direitos são violados, sem possibilidade de supervisão que seja capaz de os proteger.
A maioria dos voluntários afirma que os programas de atendimento disponibilizados pela Prefeitura ainda não são capazes de abranger todo o município. Sílvio Mica conta que a experiência de conversar e entender as particularidades de cada indivíduo, abre o horizonte e permite que a empatia e a compreensão levem à humanização dessa minoria. “Os trabalhos sociais demandam respeito, humildade e empatia. Englobando tudo, amor ao semelhante”, afirma.
PARA AJUDAR O INSTITUTO SIMPLESMENTE AMOR
Pix: 29.423.168/0001-91
Mais informações
Instagram: @simplesmenteamorrp
Site: https://institutosimplesmenteamor.com/
PARA DAR NOME E ROSTO
(Arquivo / Beatriz Jacomini).